sábado, julho 02, 2016

LORDE COCHRANE e a INDEPENDÊNCIA DA BAHIA

Lorde Cochrane

por Vasco Mariz
O brasileiro que visitar a abadia de Westminster, em Londres, ficará surpreso ao ver o vistoso túmulo de um lorde escocês chamado Thomas Cochrane, onde se lê com destaque que ele foi Marquis of Maranham. A curiosa inscrição é uma tradução para o inglês do título de marquês do Maranhão, outorgado por ninguém menos que D. Pedro I, primeiro imperador do Brasil. Mas como este que até hoje é considerado o maior herói naval da Escócia veio parar nos trópicos?

Thomas Alexander Cochrane, 10º conde de Dundonald e marquês do Maranhão, nasceu em Annsfield, perto da cidade de Hamilton, na Escócia, em 14 de dezembro de 1775. Passou a juventude na cidade de Cullross e aos 17 anos se engajou na marinha real como guarda-marinha. Durante as guerras de Napoleão contra a Inglaterra ele demonstrou tanta ousadia em operações navais que os franceses o apelidaram de loup de mer (lobo do mar). No entanto, suas espetaculares atividades navais não agradavam ao almirantado britânico por sua frequente desobediência. Além disso, sua excessiva popularidade despertava ciúmes e inimigos.

 Nesse ínterim, famoso em seu país, Thomas se candidatou ao Parlamento e da segunda vez que disputou um pleito foi eleito. Teve a ousadia de bater-se contra a corrupção na administração naval, e essa atitude intransigente lhe rendeu muitos inimigos influentes, que acabaram acusando-o de atividades fraudulentas e especulação na bolsa. Foi condenado em 1814 e ficou dois anos preso. Retiraram-lhe o título nobiliárquico e foi desligado da marinha real. Sua carreira, que se anunciava brilhante, parecia encerrada.

Em 1818, Cochrane aceitou trabalhar para a marinha chilena nas guerras de independência desse país e do Peru e, em pouco tempo, conseguiu várias vitórias e afundou diversos navios espanhóis. Suas operações navais asseguraram a independência dos dois países, onde até hoje é reverenciado.

Sabedor de sua atuação brilhante nos mares do oceano Pacífico, o ministro brasileiro das Relações Exteriores José Bonifácio de Andrada e Silva aconselhou o jovem imperador D. Pedro I a contratá-lo e convidou Thomas Cochrane para entrar para o serviço do governo brasileiro por meio de uma carta enviada em 13 de novembro de 1822, isto é, pouco depois da nossa independência.

O convite foi aceito. Cochrane partiu de Valparaíso, no Chile, em 17 de janeiro de 1823 e chegou ao Rio de Janeiro em 13 de março. O decre-to imperial de 21 de março de 1823 formalizou o acordo, e ele assumiu o comando em chefe da esquadra brasileira com a pomposa patente de primeiro-almirante, caso único em nossa história naval.

Uma vez contratado, Cochrane passou a organizar uma expedição para combater as tropas portuguesas que resistiam à independência na Bahia e no Maranhão. A esquadra era formada por uma nau capitânia, a D. Pedro I, três fragatas, duas corvetas, quatro brigues e três escunas, nem todas em bom estado.

A viagem à Bahia não foi fácil, pois os militares brasileiros não tinham prática de navegar. Em 28 de abril estavam à vista de Salvador e a esquadra preparou-se para o combate. Após a primeira escaramuça com os navios portugueses, percebendo a superioridade inicial do inimigo, Cochrane retirou suas embarcações para perto da ilha de Tinharé, fundeadouro bem abrigado, e os lusitanos desistiram de persegui-los. De parte a parte, não havia muita disposição para combater.

A situação piorou para a cidade, pois Cochrane apresou todos os navios de abastecimento que se aproximavam da baía e chegaram notícias de que um exército imperial se aproximava por terra. O almirante foi ousado e atacou os navios portugueses em seu fundeadouro, causando confusão. Afinal, o comandante luso, general Madeira, desistiu e embarcou suas forças nos navios portugueses, forçando o bloqueio para passar pelos navios de Cochrane.

O almirante perseguiu-os sem entusiasmo, apresou uns poucos barcos e contentou-se com isso. Ninguém tinha mesmo muita vontade de lutar. Se o tivessem feito, a adesão da Bahia ao Império do Brasil não teria sido realizada no dia 2 de julho de 1823. O almirante Max Justo Guedes, grande historiador da nossa marinha, deu mais importância à vitória: “Pode-se afirmar em conclusão que, nas águas da Bahia e em pouco mais de dois meses, um grande marujo e seus valentes comandados asseguraram a independência do Brasil”.