Já foi, é? Tá! Neguinha, ajoelhou, tem que rezar. Criei agora a sinopse futura jogando os búzios, O que foi, lá se foi... O que e a quem lembrar? Se o teu sol em amarelo amaranto é tão dúbio!
Crendeuspai! Agora, é tocar o bonde prá lapinha Eu, tô que tô, arrepiando, jogando duro em jauá. Beijo os dias no olhar daquela moça. Ai, Mainha! É água dura... Uns cravinhos aqui e outros acolá...
Vixe! Dona menina estou solto na buraqueira, ôie! Plantei rosas, conciliei os desejos, apalpei o escuro. Mas, vem dormir comigo, vem de chofre, a migué Jogue as cajás nesse leito de rosas onde te procuro...
Ai Deus! Negros olhos de ônix, tôloquinho, na fome! Então, entre. Mostra-te! E, dispo-te, sem cerimônias... Cai-te bem a nudez nos desejos que me consomem Oh, nívea, soberba, irreal, pulcra, serena, demônia!
Misericórdia Deus! Ó miseravona retada, seios de cerejas, Bicos pequenos, serenos, leves e desejosos no meu sonhar. Valha-me Cristo! Rezo missa em trezentos e sessenta igrejas Na chama inapagada, a eterna chama da dança do teu andar...
Senhor do Bonfim! É na real. Assim, fantasias por fantasias Escancaradas nos lençóis de jasmim para o céu pegar fogo. Solta tua imaginação açucena, adoro! Oh, noite de agonias, Jaguaretê caçando a presa nos uis e nos ais do teu rogo...
Tá rebocado! Este teu olhar de pidão incendiando me chama E depois do amor teu corpo vencido em gozos sobre os lençóis Flui, nutre de mim toda seiva dos desejos que a noite inflama. Minha Nega, é no instinto, que sou o teu boca de zero nove...
Piripicado! O meu festim ardente de desejos faz a noite cega. Afff... No agora, o corpo violão da moça, a pele morena do moço Em toques, são reféns de vontades em estandartes de entregas Com luas nos espelhos choramingando em lumes e alvoroços...
Madaso! Girafa que alucina, taça esbelta, lábios de rubis Vermelho batom que me delira, amor venal, lunar delícia Da minha boca viciada na relva negra do púbis, teu púbis! Reconhece-me? Sou eu! O teu pachá, mandarim e sibarita.
Mas, Divina! Olha o que fizeste? O azul do céu gravita em ressacas E eu colado no chão da tua esquina...
O Sibarita
PALAVRAS EM BAIANÊS:
Neguinha, (o) Nega (o) – Nome carinhoso que chamamos uma mulher ou um homem. Ajoelhou, tem que rezar – Tomar atitude e assumir com as conseqüências. Jogar os búzios – Ver o que os búzios dizem. Crendeuspai – Creio em Deus Pai. Tocar o bonde prá lapinha – Ir em frente, continuar a vida. Tô que tô – Estou, estar a fim de... Arrepiando – Não estou para brincadeira. Jogando duro – Sem perdão, levando a sério. Mainha – Nome carinhoso que chamamos a mulher que gostamos ou queremos. Água dura – Beber até muito bebidas alcoólicas. Cravinho – Batida (alcoólica) de cravo feito no Pelourinho. A preferida dos baianos. Dona menina – Mulher tirada à mocinha. Solto na buraqueira – Sem compromisso, desejando todas as mulheres. A migué – À vontade. Jogue as cajás - Botar prá quebrar, solte a imaginação. Tôloquinho – Estou louco, louquinho. Na fome – Com fome de fazer amor, desejoso, querendo. Valha-nos Deus – Ajuda-nos Deus. Jaguaretê – Onça, mulher que sabe fazer tudo na cama. Madaso – Meu Deus. Boca de zero nove – Pessoa retada, danada. Misericórdia – Perdão. Miseravona – Mulher gostosa. Retada – A tal, a danada. Piripicado, tá rebocado – Com certeza, acredite, faça fé Pachá, mandarim e sibarita – Bom vivante, conquistador. Divina – Mulher tratada como rainha.
N.A. – Na Bahia, o normal do vocabulário, do falar, do se comunicar é esse mesmo. Usamos muito as expressões que falam em Deus, Jesus, Senhor do Bonfim, São Jorge, Ogum... Exemp: Ai meu Deus! Valha-me Jesus Cristo, Ajuda-me Senhor Do Bonfim, Ave Cristo e por ai vai. Isso é usual na Bahia por ser o estado mais católico do Brasil, basta dizer que temos mais de 400 igrejas católicas só em Salvador, então, podemos ir a cada uma em todos os dias do ano e não se conhecerá todas. Somos também um povo do Candomblé atuante, ou seja, o sincretismo religioso aqui funciona, pais, mães, filhos, filhas de Santo, todo povo de Santo (Candomblé) vão às igrejas e os Padres sempre vão aos terreiros. Hoje temos muitos filhos de Santos que se tornaram padres entrando nos seminários existentes aqui.
No papel branco escrevi o teu nome chamando, É no feitiço baiano! O teu nome na boca do sapo Solto numa encruzilhada de sete vias coaxando Sob noites de desejos ao som dos atabaques...
Com duas pétalas de bem-me-quer eu me benzo Com três folhas de guiné tiro o mau olhado de ti Com um banho de vence tudo, Atô Tô, eu te venço E com sete Espadas de Ogum eu ti trago para mim.
Ó bem-amada que sobre ti descanse a lua, o luar Que em ti encerras na crucificação deste amor Já arrefecido no infinito do céu e mar de Jauá...
Ai Ogum, o olhar refinado da moça mira a noite Inquieto e frio, suspenso no vazio, foge de mim E não sei se essas luas minguadas são de açoites...
Ai! Olhando daqui o além Do que existe na impressão O amor é feito de farrapos No aquém da expressão...
Quem te fez assim soturno Turva as trevas refugiadas Escondida no chão noturno Das noites aqui renegadas...
Da tua doçura e da tua rocha Descem palavras na apoplexia, Neura noturna, luas em tochas Por secretos roteiros de agonias...
Escutado por ouças sem ouvidos No silêncio que não cabe em si O ledo além daquilo convulsivo Eu e tu renegados, sombras ali...
À meia luz em desejos desaguando. E sei lá o que é o amor? Céu ou fel? Arisco ou felino? Na carne cortando: Fantasias e fugas a dança dos véus...
Em cais de urtiga na rota de naufrágio. Bóia o sol em lodo de pântano e abismo, No cerne do coração um céu refratário. - Venço o risco, respiro atalhos, cismo.
Os meus mistérios estão nos céus... Vim do além em nave transcendental, trago sutilezas de reencarnações passadas, o espírito é célico, é luz, luz suave! Tenho o fascínio da genética, o meu zen é visionário, é a espiritualidade. A minha caminhada é de aprendizados, gênese da alma em plumas luminares. O movimento é dos astros, a razão é cósmica no espectro lunar, transparência nos detalhes... Minhas visões são apocalípticas, ondulações interplanetárias, planos realistas de origens celestial estereotipada! Meu astral é em megatom, astro candente fluído das estrelas, mistérios planetários no espaço retórico de reflexões ascendentes! Meu planeta é safira, minha nave é turmalina, estou nos cristais, meu zênite são orações, a velocidade é da luz, o cometa é topázio, minha pedra vem do crisoprásio, venho da espiritualidade.
Ah! Minha Iaiá, a vida na sobrevida faz a tua lida, Rasgo-me então nas palavras se queres me ouvir. Sou um fulano qualquer desses de trilhas perdidas Precipitando-se em deixar-me aqui e seguir sem mim...
É que no suor da memória eu abuso do vocabulário, Os versos surgem no correr de quem partiu ao esmo No sol obscuro escorrendo por bosques sedentários E nesse poema absoluto sou a brisa de mim mesmo...
Os desejos por vezes sonham ao acaso em silêncio Mirando, auscultando ao longe passagens e marcas Desfazendo-se o assim na sombra interior do tempo Sob a luz amorfa em cristal barato de plena ressaca...
O que perdura, reveste de outono a luz do teu rosto, Na essência em ti e de ti mesma na bússola perdida. Onde houveres sido, existirás Amada em mar revolto Abarcada nos reversos. Dúbia ao sonho, imprecisa...
Ai Senhor Deus! Espelho contra espelho em fogos de artifícios Pipocando da pena para o quadro nu desse céu de menoscabo. Para sua psiquê, em linhas assimétricas, tu eras o meu vício E nos desejos, eu o teu mandarim, pachá, sibarita, nababo...
Então, arribo o meu barco desenvolto de larga quilha. De noite no céu ele tem refletido as luas dependuradas De dia rasgando o espelho d’água tem o sol que brilha É, de chofre no mastro tremula todas as tuas baldas...
Valha-me Deus! Mas, venha. Entre. Ainda há uma porta entre-aberta E sem pandemônio, dispa-se De soslaio, nua, ria sem cerimônia...
À dona Dulce minha mãe aniversariante também, em memória.
Uma estrela brilha no céu, acende lua crescente, É maio primeiro, dona Dulce, é nosso aniversário Envio-te vibrações! Saudade imensa, permanente Nas lágrimas caindo -uma a uma- no mar de Jauá! Valha-me Deus! É rapidinho o 59, eu me renovo. Bondade e lucidez intensa, absoluta. Ah, perduro Neste maio primeiro em que dos tempos inovo Assim, trajando o sol na construção do céu futuro...
Na densidade, o meu íntimo substrato é a claridade Nutrida pela luz interior acesa ou no tudo habitado Sempre se perfazendo resoluto no charme da idade Do amor à vida, dos sonhos num céu azul, cifrado...
Signo de touro: desfilam fontes, jardins no meu olhar Florescendo, regando o racional que a mente conduz Nos afrescos românticos do tempo na tela do sonhar Que se revigora num sol amaranto e aí a própria luz...
Jorrando em mim na silhueta curvada das estações E nos passos aos passos espelho do meu pai eu sou Na caridade, na bondade dos leves sinos do coração, É, respiro grandeza desde menino por lei do Divino...
Assim, sigo a jornada dos meus cinqüenta e nove anos Entoando o aleluia de mais um ano lúcido, sem medos De viver a velhice. Eis o tempo correndo voraz e insano! -A vida é o instante que escorre por entre nossos dedos...
Procuro arfando os velhos tempos nesse dia de aclamas, Flutuo, crio a síntese futura dos sessenta sob céus azuis Começa, agora, no sumo dos versos, da vida e da chama, Aos amigos (as) se ontem sou, hoje serei, amanhã fui...
É que o crepúsculo espelha sol e lua nos francos Portanto, o tempo voraz, segue, no seu tropel Em marcha sem fim a rodar aprumos e prantos Nas horas correndo. Ó diversão doida e cruel.
Deus! A fúria do jovem que já houve, não há mais, A vida sucumbe nos segundos, passa, nada reverte. A morte ao palor! O que ontem foi, hoje é jamais Eu não me entrego, caio na gandaia, pinto o sete!
Comigo: meu pai, meus filhos, amigos (as) e meus irmãos As moças, as sereias do mar, da terra e as sereias do céu. Comigo: o mar de Juá, a lua e a musa em um só coração Nas fragrâncias e desejos dos corpos largados ao léu...
Debruçado no azul observo o horizonte baço, E de braços abertos recebo os abraços...